Esta semana convidamos Mario Chagas para falarmos sobre a obra “Há uma gota de sangue em cada museu: a ótica museológica de Mário de Andrade”. Veja, a seguir, a entrevista com o autor acerca da obra.
Antes de ser museólogo eu sou poeta. É como poeta que habito o mundo e me habito. Depois de ser museólogo sou cientista social. Como poeta, coloco sentido na vida, como cientista social, busco compreender o sentido da vida. Tenho vivo interesse e atuação profissional nas seguintes áreas: poesia, museologia e ciências sociais. Interesso-me pela museologia em sua perspectiva interdisciplinar e muito viva; nesses termos, interesso-me pelo diálogo com a antropologia, a sociologia, a ciência política, a história e a educação. A dimensão poética da minha produção científica leva-me para o campo das artes.
Trabalhei com múltiplos objetivos. Nesse momento, eu gostaria de destacar três: 1. examinar o pensamento de um poeta modernista de grande envergadura e verificar como ele dialoga com o campo dos museus e da museologia; 2. perceber o lugar dos museus no modernismo brasileiro; 3. compreender as articulações entre museus, patrimônios, artes e movimento modernista. No livro “Há uma gota de sangue em cada museu” não há uma essência a ser captada. Há sugestão, inspiração, processo. Espero que o livro produza inspiração, interesse por novas pesquisas, interesse e afeto pelos museus, deslumbramento. É isso. Todo livro deveria ter alguma capacidade de deslumbrar, mas isso não depende apenas do autor, depende também do leitor. Síntese: espero que os leitores do livro que escrevi tenham capacidade de se deslumbrar com a vida.
Sim. O livro “Há uma gota de sangue em cada museu: a ótica museológica de Mário de Andrade” foi resultado de uma pesquisa de mestrado. No doutorado aprofundei o assunto e escrevi uma tese com o seguinte título: “A Imaginação Museal: museu, memória e poder em Gustavo Barroso, Gilberto Freyre e Darcy Ribeiro”. Essa tese foi publicada pelo Ibram, em primeira edição, com baixíssima circulação. Eu gostaria muito de publicá-la com a Editora Argos. No momento estou aplicado na produção de artigo de fôlego sobre a Imaginação Museal de Heloísa Alberto Torres, Nise da Silveira e Berta Lutz.
Essa é uma pergunta difícil. Dificilmente eu conseguiria responde-la sem ser cabotino. De qualquer modo, penso que o livro contribuiu para a introdução na museologia brasileira de algumas novas questões, especialmente no que se refere às relações entre poética e museu, bem como entre museologia e pensamento social brasileiro. A tese citada no item anterior quis aprofundar esse debate. No mais, penso que é necessário ouvir os leitores, eles é que hão de avaliar a importância e indicar as contribuições desse pequeno livro.
A memória da infância me habita. A memória é uma chave para a poesia. Não consigo identificar como começou em mim a paixão pelas memórias, ainda que eu possa dizer que antes da adolescência a poesia nasceu em mim, um tanto canhestra, um tanto capenga, um tanto caolha. A museologia nasceu em mim depois, como um anjo torto índio e negro, convivendo com anjos loiros, de nariz aquilino e olhos azuis. O meu interesse na museologia nasceu por oposição. Fiz com bom resultado na Escola Técnica Federal Celso Suckow da Fonseca um curso de Máquinas e Motores. Trabalhei na Fábrica Nacional de Motores (FNM) e essa experiência foi decisiva. Foi nesse tempo que decidi que eu não queria ser um técnico. E foi nesse tempo que descobri o Curso de Museologia, onde imaginei aprender arqueologia. As primeiras aulas de arqueologia foram decisivas para que eu me dedicasse a uma museologia conectada com a vida. |